quinta-feira, 27 de agosto de 2009

Crer, Hoje! Por Pe. Vicente, C.Ss.R.


26/08/2009
Crer, hoje!
“Eu te conhecia só por ouvir dizer, mas, agora, vejo-te com meus próprios olhos”
(Jó 42, 5).


A convicção de Jó, entre outras coisas, ilumina o horizonte da fé. Em outro contexto, Pedro, discípulo de Jesus, perguntou: “a quem iremos, Senhor? Tu tens palavras de vida eterna” (Jo 6,68). As duas passagens parecem revelar que fé significa adesão a um sentido, um caminho vital, uma experiência com o mistério de Deus. Coisas que fazem crescer no coração humano raízes profundas que unificam a existência. Sempre mergulhados numa mística que é comunhão com o absoluto, os crentes caminham esperançosos, ainda que seja noite, como afirma João da Cruz. Apostam e respondem aos acenos da graça numa aventura incondicional.


É notável, em tempos atuais, que exista um mal-estar entre os que teimosamente carregam a frágil lâmpada da fé. Em muitas ocasiões: momentos de reuniões, partilhas, estudos – é comum alguém perguntar com certo ar de tristeza: será que vale a pena? São pessoas muitas vezes engajadas numa Igreja, numa pastoral e até com largos anos de caminhada. Geralmente são insatisfações com estruturas, pesos pastorais e até certo desencanto com a vida pessoal porque os milagres esperados não chegaram. O fato é que muitas vezes nota-se ausência de alegria e brilho no coração de quem segue e serve o Senhor. As coisas ficam mais comprometidas quando há problemas como falta de fraternidade e coisas parecidas. E daí surge uma série de confusões como a migração religiosa, busca por manifestações de fé sem compromisso com nada e assim por diante. Não é surpresa pra ninguém que tal cenário só favorece a certos aproveitadores da frágil, mas boa, fé das pessoas.


O que seria, pois, uma postura cristã mais autêntica? Certamente, para início de conversa, é difícil falar de crer se não se faz experiência de um encontro radical com a pessoa de Jesus. Mergulhar em sua vida, de modo especial nos Evangelhos e na tradição da Igreja, é fonte límpida de atualização da mensagem de Cristo. Para isso é necessário haver cultivo e dar tempo para que a graça cresça. É experiência demorada que vai abrindo caminhos aos poucos. Coisas da vida! É claro que aí não há lugar para quem deseja uma bênção imediata para que possa viver em paz e pronto. Não! O Deus de Jesus Cristo é o amor que busca relação constante com o amado. Sem tal cultivo provavelmente não haverá nem a confissão de Jó e nem a certeza de Pedro. E aí qualquer onda será motivo para abandonar o barco, ainda mais num tempo onde a velocidade e as resoluções imediatas dos problemas contam tanto. A evangelização das profundidades de nosso ser é que garante convicção no caminho do fiel.


Outro movimento do cristão é a abertura para que não haja isolamento subjetivo. Por isso a fé é partilhada. Vive-se em comunidade porque o maior fruto produzido por quem segue Jesus é o amor. A fraternidade é antídoto para o isolamento e a falta de solidariedade. Tudo isso é muito mais do que se sentir preso a uma estrutura ou instituição. A Igreja, enquanto comunidade organizada dos cristãos, depende do movimento que fazem seus fiéis, sempre dinamizados pelo Espírito Santo. Seria trágico, para o cristão, criticar sua comunidade como se ele mesmo não fizesse parte dela. Ou fechar os olhos para os problemas por medo de se comprometer com mudanças necessárias. Acima de tudo, o amor pelo Evangelho de Jesus que nos fez irmãos!


Por fim, a fé cristã parece não caber nos moldes calculistas que imperam em tempos atuais. Ou seja, não é possível medir os frutos porque eles não pertencem aos critérios humanos. Como afirma Paulo “Eu plantei; Apolo regou; mas era Deus quem fazia crescer” (1Co 3, 6). Nessa mesma direção, ser cristão é ter a gratuidade como alicerce mais seguro. Por isso mesmo é que a fé em Deus está estritamente, na tradição cristã, relacionada ao amor aos irmãos, de modo especial aos marginalizados. Foi Paulo quem disse também, depois de seu encontro com os apóstolos “(...) só nos recomendaram que nos lembrássemos dos pobres, justamente o que tenho procurado fazer com solicitude” (Gl 2,10). Assim, a fé cristã será celebração alegre e fraterna da vida em Cristo e não peso suportado por obrigação.


Autor: Pe. Vicente, C.Ss.R.